segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Epílogo: Aura


     Um dom; Como o puro suco da lima guardado de dentro da fruta. Se tivesse de ser... Ah... Quem me diria!? - Sim! - Abandona toda a redondeza de sua casca ácida, para lavar-se em folhas secas ao chão. Desce, bate, rompe! Foi deixar de ser um para ser um todo. - Todos nós estamos conectados. E como uma força que protege, me afasta de todo o mal, e me traz perto de ti. Ti que é inexistente. A confecção de seu projeto em forma foi um desastre. Já vai várias vezes. Tola tentativa. Achar que posso pedir que se materialize. Pois assim, resolvi descer do pé. Vim de choque ao chão, rente à lâmina de um pedra. Me feri, abri os poros de minha superfície expondo meu interior. E deixei vazar daquilo que me constituía.
     Vazando... vazando... - Horas a fio de movimento. Fechei minha mente; Me concentrei na dor, e Deus teve dó de mim. Tudo o que eu sou foi junto ao suco. E o que me era de fundamental restava ainda nas sementes. - Solo fértil que rende nascer da daninha ao carvalho. - Brotei novamente, como da primeira vez que vim ao mundo. Porém agora minha folhas eram mais largas, meu caule mais torto, minhas raízes mais firmes. Fui crescendo pouco a pouco, fortalecendo meu caule. De uma estrutura muda de uma muda ainda verde, à gritante dor de uma casca. Meus brotos surgiram de posse em posse a cada galho. Tomando uma forma maior e mais forte do que da anterior. Eu vi meus frutos clarearem a pele, achei estar queimando por dentro. Senti meu próprio cheiro ao bater do vento. Eu não me parecia com a planta que preocupada me encarava ao lado. - Agora eu era laranja.
     E fui crescendo, olhando para os outros lados. Eu não sabia onde minha alma estava. Mas agradeci de ter consciência de ter sobrevivido. Eu abri meu olhar. E vi a figura da qual eu pertencia – Era muito lógico. Era muito fácil e ávido. Eu até estranhava tal comportamento e a achava feia. Suas frutas, algumas podres, eram minhas vizinhas. E encostavam em mim, pediam-me favores. Eu não sabia sua língua agora. Só o olhar preocupado me encarava. Eu estava diferente, eu crescia cada vez mais. E isso a preocupava. Perdendo minha dimensão do que eu era antes. Aquele pé antigo iria morrer. E eu não mais investiria naquilo. Porque era pra ser assim, eu precisava sair para ser assim. E agora meu suco não comportava tais assimilações. Eu produzia outras formas. Saciava outras sedes. E agora tinha outros inimigos também. Mas não deixaria de exercer minhas novas funções. Pois sei que tenho mais controle. Deixei de ser uma peça, para ser um sistema. E agora eu não podia mais voltar atrás.
     Porque se de uma parte minha se revoltar, que faça revolução! Desprende-se de mim, e vá aprender o que eu aprendi. Pois mesmo solto, fruto meu aprenderia. Seria assim um pedaço do que quis pro mundo. Pois mesmo como laranja, lima ou limão. Todos estamos conectados. Quer queira, quer não.

domingo, 19 de agosto de 2012

Fim


            O cansaço de uma estrada ruim. O percorrer dela e a abstração de todos os termos negativos para nos fazer alcançar nossos objetivos. Foi o fim de uma era. Agora sou novo. E me limito a não querer mais em estar aqui. Aquela vontade pura se foi, junto com todos os meus novos anos. Foi minha primeira expectativa contrária. Queria eu escrever da mesma forma quando ainda tinha em meus olhos todo o amor que carregava antes. Oh, quanta tolice em um só ser. A verdade é que eu deixei de ser mortal. Mas não significa que imortal virei. Virei algo carregado de algo que não sei explicar, porque lavo minhas mãos de tal afirmação.
            Se definir. Quem em sã consciência se arrisca a fazer isso? Eu não seria tolo de cair no mesmo buraco. Por isso defino hoje, a minha desistência. Já foi lá morrer quem se dedicava a isso. Por em palavras o que ninguém se importa em ter. Os valores mudaram e com eles a minha “maestria” em fazer com que você me entenda. A verdade é que eu me sinto o mesmo. Mas fui lá eu ser julgado. Então de tantos palpites, tantas definições, tantas voracidades em me mudar. Eu acabo. Eu parto. Zarpo em uma direção demente sem o seu consentimento. Quer ler minha alma? Leia meus olhos, quando se dispuser a ter minha presença. Caso contrário, morra a literatura. Quer ver até onde os homens vão perder seu tempo lendo as cabeças dos outros. Quero mais um presente certo. De quem se revolta. Fui chamado de cansado em meus plenos vinte anos de idade. Vai ver tenho cisma de Rimbaud, em querer para tão novo. Não faço sucesso, pois sei o que a humanidade procura. E não é por uma vontade singular que eu vou manter esse processo.
            O fato é: escrever o que se passa por você para outro qualquer é muito infantil, muito leigo. Em quanto eu não possuir traços definidos para uma escrita densa e concisa de objetivos. A escrita não me serve para nada. História, registros, documentos. E é a única coisa que perpetua no tempo. Registro de alma não vai lembrar alguém lá do futuro como se sentia antes. Se nas palavras esse “sentir” não se prende. Quem fui eu um dia tentar. E quem será você, se continuar tentando. Meus pêsames.
            O fim é próximo, o que era para ser registrado foi. E o que será, terá outros títulos. – Com mais de cento e quarenta textos, e outros escondidos nos rascunhos perdidos. Despeço-me dessa fase. Aqui você pode encontrar qualquer detalhe de uma alma conturbada e humana feito em qualquer outro lugar em metro quadrado deste planeta. Aproveite, use-o como consulta. Talvez você consiga criar uma alma semelhante, um clone, caso descriptografe essas palavras errantes. Bom é isso.

            É o fim.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Chances




            As vezes eu olho de mais. Eu olho alem do olhar, do mentiroso, do sincero...

            As vezes eu vejo os dois, em dois tempos. Eu vejo os passados até chegar aqui...

            As vezes eu ligo tudo aquilo que eram, crescendo até chegar aqui...

            As vezes eu vejo mais pra frente, e vejo embaçado...

            As vezes eu tenho medo, as vezes eu choro e fico triste...

            As vezes eu escuto só uma música, querendo poder fazer diferente...

            As vezes a música...

            As vezes dos dois...

            As vezes a gente...

            Das vezes.

domingo, 29 de julho de 2012

Preguiça




            Quando juntaram o final, e colocaram o resto de tudo antes dele, esqueceram de terminar o que vinha depois. Daí você já viu né? Não?! Mas me pediram pra lhe dizer... eu juro que me pediram. Eh... Eu sei que não dá pra entender. Mas compreenda. Faça assim, vai ser melhor. Por isso inventaram esse verbo: compreender. Para que não se pense naquilo que não terminaram. A gente nunca sabe onde está o ponto final. Mas existe você, eu existo, e existe aquele ponto, que chamaram de final. Daí você já viu né? Não!!? Outra vez não?! Mas não precisa entender. Só compreenda.
            Entender e compreender. Sim estas duas coisas estão distintas. Assim como esse diálogo e o fato de não ser diálogo. Apesar de não ser tão discrepante a diferença, o entender e o compreender se juntam do lado mais distante. Assim como o diálogo e esse texto. Eu estou conversando com você, porem você não pode me ouvir. Eu não posso ouvir você. Nem que faça outro texto, pois assim será outro diálogo que não é diálogo. Entendeu? Não?! – Pois é não dá para eu saber. Então só continue lendo.
            Uma carta não é um dialogo, mesmo que haja outra de resposta. Posso lhe contar as novidades daqui, e você daí. Mas eu nunca vou saber como realmente estão as coisas aí, e você nunca saberá como realmente estão as coisas aqui. O dialogo em si não existe. Mas isso é mais complicado e eu vou deixar para um próximo “capitulo”.
            Próximo capitulo?! Volta lá! Já consegue ver o “não fim”? – Pois é, é assim. E é ai que está o compreender. – Você vai pensar que nada disso aqui tem sentido, mas tem sim. Eu garanto. A vida é cheia disso. Coisas que não fazem sentido, mas no todo o sentido sempre existe. É porque nós ficamos presos à lógica e a linearidade das coisas. E esquece como elas em si se comportam.
            Como no entender, em que o que realmente importa é o fim das coisas. No bolo de tudo aquilo que um dia foi, e na certeza de que não vai continuar. Ai sim vem o ponto final. Ponto final que nunca poderia ser usado no fim da carta. Por isso que quando escrevemos para os outros colocamos “Um grande abraço do seu amigo (espaço) (seu nome)”. É porque não existe esse final. E não há de existir papel para se colocar um final a uma carta. E não há carta suficiente para se comportar um diálogo. E não há dialogo neste mundo que tenha um fim.
            Eu não acredito no fim. Ele não existe. E quando falo isso penso logo no “compreender”. Ele sim é completo. Pois não termina. Se você não me entende, e nem me compreende, ai a coisa fica séria. É porque não estamos no mesmo mundo mesmo! Porem a viajem que nós podemos planejar pode nos aproximar. E tenho certeza que nós vamos planejar até morrer. Então é melhor você me compreender, e ai agente economiza tempo.
            Porque nós mortais somos assim. Nós não temos tempo para terminar as coisas e aí colocamos um fim. Só que nos esquecemos de entender. Daí vira compreensão. E tudo continua. Você pode se esquecer, eu posso morrer, mas não adianta. Ainda não acabou. E outra coisa. Não teve início. Não, não! Nem vem me dizer que teve, pois não teve. Tudo o que nós humanos somos é uma continuidade daquilo que não teve início para um lugar onde que não se tem o fim. Aí pegamos toda a nossa pressa, juntamos rapidamente, e colocamos um ponto final.
            Pois o ponto final é a marca de que antes dele teve um início. Só que antes do início começar, lá estava outro ponto final. E no diálogo falado tem ponto final? Pense bem... Eu acho que não hein?! Pois é, a gente não consegue admitir. Mas o inicio e o fim nunca existiu.
            Nunca existiu a chegada, nem a partida. Nunca existiu o cumprimento e a despedida. Nunca existiu a letra maiúscula, nem o ponto final. A gente que inventou isso. Porque nós tivemos pressa em ser aquilo em que nós não conseguimos ainda medir do que somos.
Por isso entendemos, para terminar (o que não teve início). Por isso compreendemos, para continuar (o que não teve fim).
E se você não concorda comigo, você pode fazer duas coisas: Entender – e abarcar tudo isso como verdade – ou compreender – e ter em mente de que ainda vai ter que aprender (na vida, quem sabe) – e enfim, entender.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Bitransitivo

     As páginas no início deste livro estavam esquecidas. Ofuscadas na memória vazia de quem não compreende mais o sentido de fazer aquilo. Feito religião. Que aos poucos vai perdendo seus seguidores para a dura realidade do tempo. E assim eu me esqueci de como era. Cansado de ser sempre o contrário do requerimento. Um dia eu soltei o livro pela capa. Ao me deparar com esse verbo, que um dia fora tão nobre e hoje carrega um solo cuja alma infértil não consegue nem absorver a própria água que o rega. Como ler em uma porta de vidro: “empurre” e ela mesma só se abrir após ser puxada. Chega um momento em que o sentido toma faces polivalentes, em que seu próprio sistema, a invenção de novas formas é automático de acordo com o nosso nível de persistência. Eu estava farto. De lutar contra algo que mudava de forma cada vez mais, a chegar a um momento em que eu questionei sua existência. Pois assim eu me levantei, derrubei as paredes desse labirinto, e as ergui outra vez. Porque eu cheguei a me esquecer como havia parado ali. Porém eu sabia exatamente o que lá habitava. E resolvi remover esse verbo da minha história. Sem contexto, sem complemento, nem pronomes para disfarçá-lo. Pois eu sabia que o que eu amava não tinha nome. E o que não tinha nome estava morto.

domingo, 3 de junho de 2012

Do amor

(Inspirado em "Do Amor" - Tulipa Ruiz)


     Eu prendo o tempo e vou soltando-o devagar. Pensando sempre em não perder os pensamentos que me fazem ver os detalhes. Vou observando as luzes da cidade, querendo encontrar. O “X” deste mapa é onde seu coração está, enterrado sob a luz de um poste qualquer. Que vai esquentando-o em calor mínimo para não congelar. Todo o seu corpo em delírio querendo descobrir: O que eu faço aqui? – Toda minha visita é um disfarce para te distrair. Minto verdades querendo do mais puro ser. Encher ou esvaziar?
     Eu veto a tua mente e vou deixando os fatos soltos por ai. Só pra você não poder se confundir. Como uma torneira sem fechar. Pensamentos demais para vir. Buracos no bote querendo me afundar. Quantos deles eu ainda eu vou ter de tampar? – Eu sento no banco dos velhos no ônibus sentindo o calor com as mãos. Na ultima rota em que vamos zarpar. Ver coisas além, tomar da sabedoria. Mas sinto que não tenho idade para enxergar. Vem-me só a paz. De quem um dia estará ali.
     Eu roubo o teu carinho e vou devolvendo devagar. Aprendendo com a prática de arriscar. Lendo livros nunca lidos e em que posso aprender. Coisas e como te agradar. Uma forma de saber o que está a sentir. Sem me expor e sem me manchar. A dor é a palavra mais fraca das palavras que estão para agir. Não sei como consigo, mas estou sempre aqui. Olhando esses olhos de árvore que cresce sob o vento de outono intenso.
     Eu vejo as folhas secas dentro do seu olhar. Puxando em sugo toda a minha proteção. Um ponto fraco e cego. Onde sou fraco você fraco também será. Um dentro do outro não podendo sair. Pedaços que vamos ganhando do convívio. Metade de um corpo inteiro ser seu. E eu? - Vou me perguntando em qual corpo estão meus pedaços. E se um dia vou voltar a usar. Te vendo pintado de cores que eu sempre gostei de ter. Eu só não perdôo se um dia essas cores desbotar. Mas até lá. Eu vou retocando.
     Eu guardo do amor a melhor parte para você. Em um lugar que ninguém vai te ver. Quês casas são essas onde nós vamos morar? – Em que momento perceber que não queremos nada daquilo. E se vamos ficar perto ou longe; Se vamos pensar perto ou longe. Ninguém garante que um dia vou te reencontrar. O amor num baú para ninguém encostar. Mergulho do maior fundo sem se quer perder. Melhor seguro do que não com você.
     Eu prendo o seu amor e vou soltando-o devagar...

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Curioso Entender


     Eu estou adorando isso. E eu sei que vai passar tão rápido, que nem vai dar tempo para uma vida inteira. Entender esse sentido marca. Mas ainda bem que o sentido se desprende do entendimento. Viver perdendo as coisas é algo tão bom. É bom errar às vezes. No vazio de uma tarde, perder a tarde inteira. Se perder. Olha que coisa maravilhosa? Viver como uma mosca com o seu olhar multifacetado para o mundo nunca foi tão fiel. E esta visão caleidoscópio das coisas é o que me faz viver. Ver algo que era algo dar duas voltas e voltar atrás. Não era algo, era alguém. Mas eu voltei atrás.
     E ir 'indo', aprendendo um dia olhar pelo lado certo. Aquele lado que não reflete, e não fingi ser quem não é. O lado puro das coisas.
     Feito o buraquinho, deste instrumento, por onde a luz passa.

     O centro da mandala.

domingo, 20 de maio de 2012

Verbo


     Era uma vez como uma vez só pôde ser. De dente tantas vezes já concebido, onde nasce o ser. Um ser dentre desses seres com outras vezes. Vezes que só pode ser como as vezes que aqui veio nascer. Seres, vezes, eras. Histórias criadas, interpretadas e reescritas de dentro de cada ser. O mundo é grande apesar de ser um só. O tempo e único apesar de ser vários. O abraço do ser no tempo que insiste em viver. O pisar do ser no mundo, que insiste em do mundo gastar, tornando o tempo único. E quem se desgasta mais? O mundo, o ser, ou o tempo? Todos se perdem no amor próprio que possuem um pelo o outro. Em uma ciranda infinita que os homens dessa terra me ensinaram ser o viver. Viver é o que eu não quero. Nem de mim querer morrer. Quero ter a imortalidade da vez. Aquela que se repete infinitamente sem se perder. Deixando no mundo, no tempo, a marca dolorida de um único suicídio de oportunidade no ser. Ser uma vez, como uma vez só pode ser.

sábado, 19 de maio de 2012

Cólera Sanguínea



     Abster. Em um sentido único, como todas as palavras de nossa linguagem, nunca carregada de um só sentido, porem como todas as palavras que um dia aplicamos em vida. Ela sabia que abster só possuía um radical de sentimento. Até que um dia, um fato, um nome, fez com que sua organização pessoal do seu ego revirasse de ponta cabeça.
     Lídia era uma mulher que já fora menina. E tal afirmação não pudera ser tão obvia pelo fato dela ter carregado consigo sua maior característica infantil. Ela era medianamente jovem de uma maneira a não se definir idade. E possuía o dom da energia pura, a ser convertida em diversas tarefas. Coisas do seu ofício. Uma vida comum comparada a do que os homens mediam como importante. O que fazia com que qualquer fato incomum, parecesse corriqueiro.
     Porém Lídia possuía muita energia, de uma forma que seu recipiente de cristal humano não suportava na maioria das vezes. Essas suas vontades eram solvente em ultima instância, mais universal que a água. Que um cair errado de qualquer outra partícula, poderia modificar toda a configuração de seu todo. Colérica, sempre que exposta em situações pouco extremas sentia-se ameaçada e pronta para qualquer ato precipitado.
     Ela carregada dessa propriedade vagava o mundo com todas as referências de seu casamento. Por ser a única coisa que possuía em sua mente. Onde em um efeito confuso nobre e raro de uma mente pulsante, havia esquecido o único detalhe importante do portador da segunda aliança. Vinha em um liquidificador turvo da manhã, logo após a abertura da mente, e um pouco antes da abertura dos olhos. Seu eu procurava reviver todos os momentos juntos com aquela pessoa.
     Viajou entre as lembranças, lembrou de quando era muito nova, de quando suas pernas eram firmes e hábeis, de quando seu sorriso refletia no Sol, e assim era lembrada. Lembrou de seu primeiro beijo com seu jovem amante, de suas brigas de como ela era cega e tola com suas decisões. E de como ela queria ser novamente tudo aquilo que fora, porem mais calma, mais detalhista.
     Espreguiçou-se na cama, estalando as vértebras que ainda estavam duras. Abriu os olhos, vagou dois balões com o pescoço mole, e sua mão sobre sua nuca perfumada pela última noite, e parou sentada como se estivesse possuída. Ela não conseguia lembrar o nome dele. Ela havia rodeado todas as lembranças até o seu casamento. Lembranças felizes de quem nunca tiveram problemas conjugais. Mas mesmo assim não conseguia lembrar o nome de seu amado.
     Apertou os lençóis, com punhos cerrados e vermelhos de calores noturnos. Seu pensamento cintilava como as jóias da festa anterior. Sua maquiagem fervia junto com o corar de seu rosto. Havia uma falha. Seu medo, sua inocência de perder tal amor. O amor em que ela havia decidido em segredo ser o último. Por não conseguir tais sensações em outros, por se sentir conectada a ele.
     Eram tantos momentos bons, intrínsecos por ele. Sempre querendo analisar e trazer a superfície dos sentimentos mais dissonantes de Lídia. Ela sempre ficava confusa, pelo jeito que ele olhava seu rosto, seus olhos. Procurando em casa após cada encontrar aquela beleza em que ele tanto citava, olhava o espelho, sem encarar. Não se entendia, mas entendia-o, como se recebesse o manual de instruções errado. De como se meter com ele, e não com ela mesma.
     Estava farta de tentar. Vieram em sua mente agora os momentos de brigas. De incongruência, desentendimentos naturais da sede. Lembrou de como tivera que mudar para ter ele por perto. O respeitar, e dobrar seu espírito para uma sabedoria digna de mulher. Símbolo da força. Dominante, põe sua mão em risco, nas presas de um Leão, carta de tarô. Onde sua cria podia lhe matar, sem nem lembrar-se de sua dona.
     Esvaziou sua mente. Lídia agora era sua segunda personagem, distinta, consciente, realista, portadora dos olhos de Atenas. Reuniu todas as suas experiências, e de como já era e planejava se ver no futuro. Seu coração flagelado; batendo em quatro tempos na valsa. Experiente. Sua alma deixava de ser colérica e com todos os seus fragmentos passava a ser sanguínea. Ela possuía o controle de tudo, estava dopada pelo controle mental de sua vida adulta, estava se libertando de preconceitos infantis sobre seus sentimentos.
     Foi quando vacilou seus olhos. Sua pupila contraiu, voltando o foco do dia presente. Fez a primeira inspiração do dia, tomada por toda a sua historia. Neste momento, sentiu seu cheiro favorito. Uma mistura de campina vasta e plana, algodão, leite de mãe amada, trigo a ser colhido, ácido de ditador, dia seminublado, e a vasta sensação de território grande, país. Sentiu o peso pedante ao lado na cama, um calor desconhecido, no virar dos olhos para a esquerda, viu as iniciais em uma toalha bordada no cabide do quarto: L & R. Contraiu os olhos, desconfiada e surpreendia.
     De repente seus olhos arredondaram em susto. Via seu nome sendo bordado na toalha. Como se um anjo a tivesse ornamentado, com letras tortuosas em estilo de casamento. Via o & em contraste de ouro, sendo pintado pelos Deuses de todas as religiões. Rufar de tambores a cada formar das letras. E antes de completar a segunda letra do ser de suas lembranças. Foi deslizando os olhos no escorrer de uma panela amanteigada, esquentando cada vez mais a cada milímetro de queda.
     “-Rafael”. - Pousou seus olhos sobre aqueles cabelos grossos e despenteados de quem estava ao seu lado. Ela com os lábios vermelhos e suculentos de quem havia passado fome. Sentiu sua espinha tomar com frio toda sua estrutura óssea. Lídia sempre sentira isso nos encontros escondidos de namoro. Porem já não guardava nenhuma lembrança de quem era. Seu nome saltava em sua memória.
     Torceu seu corpo por cima dele. Sentiu no peito em brasa o calor tranqüilo de quem ainda estava em rota de sono. Sentiu desejos, vontade de estar no sonho dele também. Lídia aproximou seus olhos arregalados em seu rosto rosado, ajustou sua postura ao incomodo rápido de seu homem. E lhe beijou com toda a sua energia canalizada ao seu rosto branco-avermelhado, sem fazer estalos, abençoando em doutrina própria de quem um dia resolveu dividir sua cama.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Karma

     Pra desistir é um passo despreocupado. Uma forma sem sentido, o não tentar e entender. Dar quarteirões de vontade e não voltar. Sabendo daquilo que não vai dar certo. É fácil prever, escutar o destino, te falando o que não se deve fazer. Perder mais? Por quê? – Já era a era de dizer os nomes, falar coisas, complicar. O difícil se prende a aquilo que não é tentado. E ai se volta a questionar. Por que não tentar?
     Andar através do tempo de uma semana inteira, já com leve de não ter ninguém pra encarar. Por quê? – Para aqueles que carregam horas a fio de uma desinência no pensamento, sabendo que pode errar. E abrir o espaço, tirar fumaça do barro, ver que não é tudo aquilo em que outro nem está a gastar.
     Ele não gasta o mesmo tempo que você gasta no pensar.

     Desistir é um passo despreocupado prestes a se pisar.
      Meu कर्म.